Imagine as cenas… Domingo. Onze e meia da manhã. Você pega o telefone, liga para uma amiga. Do outro lado da linha, uma criança de oito anos atende. Você pergunta pela mãe da menina. Ela responde que a mãe está trabalhando. “E seu pai, está aí?”. Com voz triste, a pequena responde: “não. Ele também está trabalhando”. Em mais alguns minutos você descobre que a menina está sozinha. É domingo e a filha dos seus amigos está sozinha.
As cenas que tentamos reconstruir juntos não são raras. Elas acontecem na casa de amigos meus. Talvez aconteça em alguns lares que você conhece. Ou mesmo em sua casa.
Deixar uma criança sozinha uma vez ou outra não é anormal. Não significa uma agressão emocional a um filho. Mas tenho notado que é cada vez mais comum encontrar crianças que são órfãos de pais vivos. E pior, muitas vezes, estão abandonados pelos pais, mesmo vivendo na mesma casa.
No parágrafo anterior eu usei o termo “agressão emocional”. Eu quero voltar a usá-lo, pois entendo que crianças deixadas em casa, sozinhas, ou até mesmo cuidadas por avós, tias, babás etc etc são, diariamente, são agredidas emocionalmente por seus pais. Qual o vínculo que pode existir entre uma mãe e uma filha que, até no domingo, próximo do horário de almoço, não estão juntas? Como essa criança pode ser feliz se brinca sozinha, se tem decide por si mesma o horário do lanche e nem sabe a que horas a mãe e o pai chegam?
São filhos abandonados. Filhos que crescem, mas que crescem sem saber o que é ter um pai e uma mãe de verdade. Como poderão ser bons pais? Será que vão conseguir?
Tenho um amigo, doutor em Psicologia, que um dia me disse algo que sempre recordo. “Amor de filho, a gente conquista. Não está no DNA”. Esta é uma grande verdade. Nossos filhos não nascem programados para nos amar. Para que exista amor entre pais e filhos é preciso ter relacionamento. Relacionamento de verdade – com tempo, atenção, carinho, dedicação, cuidado, disciplina.
As pessoas têm seus compromissos. A vida moderna exige muito de nós. Não é nada fácil manter uma casa e ainda dar conta de todos os compromissos financeiros. E todos nós temos projetos pessoais, queremos realizá-los. Mas uma coisa é fundamental saber: o que fazemos ou deixamos de fazer por nossas crianças vai determinar a relação que teremos com elas no futuro. Vai definir como será a vida de nossos filhos e a maneira como vão lidar com a vida, com a sociedade.
Ouça o comentário completo do jornalista Ronaldo Nezo